quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Olhos grandes



Tenho olhos grandes que me deram alguns traumas quando achava que tudo era imenso a minha volta. Experimente entrar naquela escola que você aprendeu a ler e que tudo lhe parecia gigante: as mesas, os jogos, a lousa e o jardim..ah! esse era o maior de todos!!Á medida que crescemos, os espaços diminuem para dar-nos conta de que precisamos galgar, mantendo a visão infantil de lupa. Lembro-me que na minha escola tinha um trenzinho de concreto vazado, na entrada, que entrávamos por um lado e saíamos pelo outro cantarolando: “piui, piui, piui, bote a mão no meu ombro, piui, piui, piui, não deixem o trem descarrilhar...” e seguíamos naquela ciranda sem fim. Por muitos anos, fiquei com aquela imagem de trem já que na minha cidade não o tínhamos diante do nosso nariz, não conheci o trem de Salvador, só sabia que era velho e circulava no subúrbio. Quando fui à Europa e viajei nos trens, vi que eles nada tinham a ver com aquele trenzinho de concreto e colorido que conheci e viajei. Meus olhos grandes mergulharam naqueles vagões e no vai-vem de tanta gente diferente. Se eu tivesse conhecido esse trem na época do outro trem, veria que existe gente com os olhos muito maiores que os meus, e certamente não teria o apelido de “zoiudinha”.
Chapeuzinho Vermelho perguntou ao lobo mau: “Por que esses olhos tão grandes?” – ele respondeu: “ È para te ver melhor!”. E, eu, digo: quem dera!! Quem dera se eu e o lobo pudéssemos ver melhor com os grandes olhos que Deus nos deu. Assim, eu teria de imediato uma resposta para dar àqueles que me chamassem pelo alcunha acima. Pensava em algo, alguém belo para dizer: sim, meus olhos são iguais aos de...”, mas não encontrava nenhum além dos do meu pai, que me davam medo, quando me olhavam firmes, nessa época. Percorria o mundo dos animais e só me apareciam batráquios. Até a minha melhor amiga, uma pinscher “zoiudíssima”, que vivia conosco, não era sinônimo de beleza no mundo dos cães e todos me associavam a ela.
Reforçando a minha desesperança, o cineasta americano, Steven Spielberg estreia o grande sucesso de bilheteria: E.T., O Extraterrestre (1982), aquela figura esquisita, com os olhos verdes imensos, mas maravilhosamente curiosos e comoventes. E na emoção desses olhos me fortaleci e depois de um tempo percebi que olhos grandes eram signos de mistério, porque diante de tanta exposição era preciso encontrar uma defesa: a ambiguidade. Desejos revelados em olhares que não os denotam e dão mil possibilidades que afasta cada vez mais a percepção do óbvio.
Os “janelões” da alma confundem e quando bem maquiados podem até hipnotizar e como bem cantou Chico Buarque, em Caruso: “...mas como estás com pressa e não paras jamais/ seria o caso de nadar, sem esquentar a cabeça/ deixar-se levar pra dentro de dois olhos grandes.”

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